Recuperação de calor nos sistemas de ventilação mecânica em edifícios

Trata-se da avaliação do processo de recuperação de calor sensível nos sistemas de ventilação mecânica em edifícios, em várias localidades do território português, procurando, em primeiro lugar, as diferenças devidas às nuances climáticas, mas integrando também a influência da eficiência do recuperador de calor (RC) e a perda de carga, sendo estas função dos caudais de ar de ambos os escoamentos, o do ar novo e o do ar de extracção. Para um dado modelo de RC, quanto maior for o caudal, maior será a perda de carga e menor será a eficiência. O clima de algumas das localidades consideradas neste trabalho apresenta maior potencial de recuperação, o que, no entanto, não é suficiente para se garantir a viabilidade da recuperação de calor. A combinação dos dados físicos do RC com os do clima já dá uma ordem de grandeza da energia final economizada, EFE, o que poderia constituir um critério de avaliação que se julga não ser suficiente, razão por que se partiu para a análise económica que se apresenta no final. A decisão de optar pela recuperação de calor deve ser técnica e economicamente prudente, e não pode basear-se apenas em sensibilidades, tal como também não deverá ser imposta por qualquer regulamento.
Introdução
O tema da recuperação de calor nos sistemas de climatização, no que respeita aos sistemas de ventilação mecânica, é muito antigo e ganhou relevância acrescida após os choques petrolíferos da década de 70 do século XX, sendo hoje a sua utilização inquestionável, sobretudo nos países do norte da Europa, onde as temperaturas do ar são baixas durante uma parte significativa do ano e, por consequência, as necessidades de aquecimento também o são. Mesmo nos edifícios de habitação, a recuperação de calor nos sistemas de ventilação mecânica é hoje uma prática comum, mas, também noutros edifícios, mesmo que apresentem menores necessidades de aquecimento. Contudo, nos países do sul, sobretudo nos da orla mediterrânica, ou com clima similar, as necessidades de aquecimento são inferiores, o que pode, pelo menos tornar questionável a adopção de RC nos sistemas de ventilação mecânica, senão de todo, pelo menos em alguns casos.
A discussão em torno deste tema acendeu-se nos últimos anos, após a publicação do Regulamento 1253/2014, de 7 de julho de 2014, da Comissão Europeia [1], na sequência da Directiva 2009/125/EC, do Parlamento e do Conselho Europeus, no que se refere aos requisitos do ecodesign para as unidades de ventilação. Aquele Regulamento estabelece que todas as unidades de Tratamento de Ar Novo, bidirecionais – as que dispõem de ventilador de insuflação de ar novo e de ventilador de extracção do ar viciado – devem ter obrigatoriamente um dispositivo de recuperação de calor.
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A recuperação de calor nos sistemas de climatização
A ventilação, entendida como a renovação de ar, é um processo primordial nos sistemas de climatização em edifícios cuja importância é mais inquestionável do que o próprio conforto térmico. Há aplicações em que a totalidade do ar do processo de climatização é somente ar novo, como em ambientes hospitalares, ou outros em que a densidade de ocupação é elevada.
A renovação de ar impõe a adaptação de unidades de tratamento de ar (UTA) com filtros adequados à qualidade do ar captado, também às necessidades do processo pretendido e dispositivos para promoverem a recuperação de calor, o que implica um acréscimo de perdas de carga nos escoamentos de ar e, por consequência, a um acréscimo de potência dos ventiladores. Há também sistemas em que todo o ar novo é tratado exclusivamente, sendo essas unidades designadas de Unidades de Tratamento de Ar Novo (UTAN).
Os RC, nos sistemas climatização com ventilação mecânica, são dispositivos de permuta de calor que, em geral, assumem três tipos construtivos: permutador de placas, com fluxos cruzados, ou uma configuração mista de fluxos cruzados e contracorrente, roda térmica e duas baterias ligadas entre si por um circuito hidráulico, cuja designação em língua inglesa é “run-around coils”. Cada um destes tipos tem o seu campo de aplicação específico que aqui não é discutido e, por essa razão, este artigo cinge-se ao processo em si, se a recuperação é apenas de calor sensível, caso em que se manifesta apenas sob a forma de variação da temperatura de bolbo seco do ar novo, ou se também é de calor latente, caso em que há variação da humidade específica do ar. A recuperação de calor sensível pode constituir um pré-aquecimento, ou um pré-arrefecimento do ar novo, dependendo dos processos a que a ventilação mecânica está associada e da diferença entre a sua temperatura de bolbo seco do ar novo e a do ar extraído dos locais, enquanto a de calor latente pode constituir um ganho, ou uma perda de humidade específica para o ar novo, neste caso dependendo da necessidade do processo e da diferença entre a humidade específica de ambos os escoamentos de ar.
A opção pela recuperação de calor deve ser realizada numa perspectiva de “custo-benefício”, o que significa que, quer seja em projecto de instalações novas, quer seja em reabilitação, deve ser feita uma avaliação rigorosa dos custos envolvidos face aos ganhos esperados. Os custos têm uma parcela que depende do investimento, financeiramente actualizado, outra que inclui os de manutenção anual do equipamento e outra variável que são os custos de exploração, aqueles que estão associados à energia necessária para movimentar os ventiladores. No lado dos benefícios está o custo da energia evitada com a recuperação de calor. Quando se trata de economia, a variabilidade está presente, uma vez que tanto o custo de energia nos mercados como as taxas de juro do sistema bancário não são constantes.
Alguns aspectos fundamentais da recuperação de calor
Uma vez fixados os caudais de ambos os escoamentos de ar, conhecidas as temperaturas extremas e fixada a temperatura a alcançar com a recuperação, o que é equivalente a fixar a eficiência, ficam conhecidos os dados para o projecto do recuperador de calor. Com estes dados procede-se à selecção do recuperador, dentre os disponíveis, ou recomendados, pelo fabricante de unidades de tratamento de ar considerado. (...)
Por Armando Costa Inverno
Eng. Mecânico, Ex-Professor do Instituto Superior
de Engenharia – Universidade do Algarve
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